APPLE’S BUSINESS MODEL


Cambridge, Massachussets, 2024
    
Spoiler alert: devo avisar quem lê de que pode estar enganado quanto ao âmbito deste texto. Não vou escrever sobre o que julgam ser o melhor negócio dos Estados Unidos, mas sobre o que de facto é o melhor negócio dos Estados Unidos, e que não só inspirou o negócio que os leitores pensam ser o melhor, mas também converteu uma mulher que não gostava de fruta numa verdadeira apreciadora, que facilmente sucumbe à tentação de comer duas maçãs nos quinze minutos de caminho entre o supermercado e casa, o que até agora fazia com pão quente.

    O negócio de New England são as maçãs, verdadeiras, vermelhinhas, que se distinguem das maçãs que provei Europa fora, e que sempre me pareceram uma fruta seca e desenxabida. Pelo contrário, as maçãs daqui são extremamente frescas, têm um sabor forte e são muito suculentas, de tal forma que não é possível comê-las e ler um livro ao mesmo tempo porque as páginas ficam lambuzadas de água açucarada.
    
    Sem tirar o mérito às maçãs, a verdade é que os americanos souberam tirar bom partido delas. As várias quintas com macieiras abrem portas para o Apple Picking. Apanhar maçãs é uma verdadeira febre – não há quem, nesta altura do ano, não tenha combinado ir a uma quinta, e até Harvard Law organizou uma expedição para o efeito. Começa por ser difícil escolher o destino, porque cada quinta promete um dia mais preenchido do que as outras, oferecendo tudo, desde live music, festivais de prova de cidra, labirintos de milho e workshops sobre como esculpir abóboras. Há até uma quinta conhecida por ter plantado as macieiras segundo um percurso labiríntico em que as pessoas entram sem fim à vista (“bush maze”). 

    Lá chegados, somos surpreendidos por uma máquina multibanco, espantosamente colocada no meio de um terreno de terra, e uma loja cheia de maçãs, donuts de maçã, e várias garrafas de plástico de grandes dimensões com apple cider (que aqui não tem álcool). Vemos que as duas camionetas da escola no grande terreno de estacionamento à esquerda depositaram os alunos no campo da quinta à direita, que se dedicam em bando a esculpir espantalhos e a fazer corridas de sacos.

    À entrada há um balcão onde podemos comprar sacos para apanhar maçãs. Depois, esperamos que um trator nos venha buscar (trator pelo qual também pagamos, naturalmente), e que nos leva, através dos pomares, até um ou dois pontos estratégicos, onde nos largam, sem supervisão e sem qualquer restrição temporal, e nos deixam circular ao longo das macieiras que se estendem em filas intermináveis. Cada fileira de árvores tem um modelo de maçã diferente (como, por exemplo, o modelo McIntosh), e em cada uma há dois ou três escadotes para podermos chegar a todas as maçãs e fazer o favor de limpar bem os frutos das árvores. As maçãs vermelhas têm uma cor especial, ligeiramente rosa avermelhado, meio ocre, que faz com que as fotografias que tiramos das macieiras adquiram um natural filtro rosado do Instagram, estilo Mayfair. Os condutores dos tratores são todos muito novos, e parece que estão num campo de férias – param para se cumprimentar, riem-se de piadas entre eles, sempre muito animados. Nos supermercados, as maçãs vendem-se em sacos com duas peguinhas, tal como os sacos que nos dão para apanhar maçãs, uma lembrança permanente das quintas de onde vieram e de que devemos lá voltar. Cada saco, com cerca de quinze pequenas maçãs verdes, é feito de um material muito resistente que funciona como uma taça que pode ser pousada em qualquer lado, e que por ser transparente não permite que o nosso olhar esqueça as maçãs que tem à frente. 

    E assim, caros leitores, conseguem os donos da quinta o que seria impensável – ser pagos para que outros tenham o trabalho de recolher a fruta que é deles, e entregar diretamente o produto ao consumidor final, que alegremente paga a vinda até à quinta, geralmente remota, e a própria viagem de trator até às maçãs. Gostaria de sugerir que se implementasse este modelo em Portugal, embora tema a reação de um mais lúcido português, perante a amável proposta de que conduza quilómetros por sua conta, suba a um escadote, pague a entrada na quinta mais o saco para enfiar as maçãs, cerejas e figos, carregue o saco até ao carro, e volte a casa. Se o leitor não se deixar impressionar e, confiante, acreditar na generosidade do povo português, peço que prossiga a implementação do sonho americano em solo lusitano e que depois me conte como correu.

    P.S.: Steve Jobs teve a ideia de dar à empresa o nome Apple depois de visitar uma destas quintas.




 





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